domingo, 7 de março de 2010

Anjo Daniel

Esse fim de semana comentei uma história que estava enterrada no fundo do baú e fui me lembrando de outra e outra, e vou escrever antes que volte pro fundo do baú.
A memória veio porque meus novos amigos-vizinhos austríacos comentavam com muita emoção que já tinham ouvido falar antes do rock'n'rio porque eles gostam muito do CD do Iron Maiden gravado neste evento. Aí eu comentei sem muita atenção que estava lá, mas que logo depois do início do show tomei a decisão de ir embora. Mediante seus olhares assustados fui agregando informações...

O rock'n'rio nunca vende ingressos combinados, então você tem que comprar separadamente de cada dia. Eu não tinha comprado para o dia do iron, já que eu não gosto muito, mas meu irmão Daniel resolveu me dar de presente porque todos os meus amigos e irmãos mais novos iam. Bom, muito contente, aceitei o presente e fui. E curti muito o dia. No entanto, pensei que era uma decisão racional evitar o tumulto do show, que eu não gostava muito, mais o tumulto do ônibus para voltar depois, e pegar o ônibus antes do show terminar para voltar à casa do Daniel, que era do outro lado da cidade. Muito feliz, entrei sozinha no ônibus, sentei (o que era uma raridade) e... dormi. Fui acordada já na última parada por ninguém menos que o motorista do ônibus, que o queria fechar. Sozinha, sonolenta e totalmente perdida na famosa cidade do Rio de Janeiro, entrei levemente em desespero. Bom, eram 2hs da manhã, era um lugar não muito lindo e agradável, eu não sabia onde era, e era o Rio. E eu não tinha um tostão no bolso. Por fim, depois de andar um pouco, encontrei um orelhão. E liguei a cobrar para a casa do Daniel. Após relatar o episódio, ele gentilmente respira fundo um par de vezes e responde: "pega um taxi que eu te espero em baixo, para pagar". Então eu chego, suja, levemente bêbada, pobre, e ele está de pijamas, na rua, com um roupão por cima, e pantufas, com a carteira na mão. Paga o taxi e subimos sem trocar nenhuma palavra. No final ele pagou para eu ir e para me resgatar.

A outra história, também envolvendo mega shows de rock, Rio de Janeiro, Daniel e seu senso de paternidade foi ainda em 1996. Era o famoso ano do vestibular, e contra a vontade dos meus pais, eu resolvi fazer vestibular para publicidade no Rio de Janeiro. O Daniel pagou e fez a minha inscrição na prova e disse que na época me enviava a passagem de ônibus. No final a situação mudou, minha mãe até me pagou uma passagem de avião para eu ir fazer a prova. No total fiquei 3 semanas, porque o vestibular era distribuído em 3 fins de semanas seguidos. Foram 3 semanas essenciais na minha vida, creio que foi quando mais nos aproximamos e consolidamos a nossa cumplicidade (Daniel e eu). Trocamos histórias de família, complexos, como resolvê-los, filosofias, músicas, tudo. Ficamos ainda muito mais amigos.
A questão é que um dia eu estava lendo o jornal e vi o anúncio do Colgate festival, a ser realizado na apoteose um fim de semana desses que eu estaria lá. Nem lembro direito quem tocou (tinha cypress hill e o baterista do Ramones), mas na minha cabeça de adolescente era totalmente imperdível e impensável eu estar no Rio, no momento do festival, e não ir. Assim, no jantar, eu o comuniquei que iria ao show.
Silêncio. E o diálogo que se segue:
- Você vai ao show com quem se não tem amigos no Rio?
- Hum, você tem razão, neste caso vou ter que ir sozinha.
- Você vai sozinha a um show de rock na sapucaí?
- Sim, bom, se eu não tenho amigos no Rio, tenho que ir sozinha.
Silêncio.
Creio que ele começa a entrar em pânico. E pensa que ainda tem mais argumentos para me dissuadir.
- Mas como você vai voltar? Me desculpe, mas eu não vou te buscar.
- Ah, não estou esperando que você me busque, imagina. Eu volto andando, é pertinho.
Silêncio.
- Você volta andando de um show da sapucaí de madrugada sozinha?
- Você acha que é perigoso? (minha OBS: incrível como eu nunca tive muita noção de perigo).
- Sim, acho que é extremamente perigoso.
-De verdade?
- De verdade.
- E não tem ônibus de madrugada?
Silêncio seguido de um olhar extremamente penetrante.
- Hum, bom, neste caso, vou ter que voltar de taxi.
- Nenhum taxi vai querer te trazer porque é muito perto, vai dar menos de R$ 2.
Silêncio.
- Bom, vou pensar em alguma coisa. (eu)
- Que coisa?
- Por exemplo, eu posso dar R$ 5 pro taxi me trazer.
Silêncio.
E bom, não sei se a conversa acaba assim, ou o que se seguiu, ou se o diálogo foi exatamente assim, mas em linhas gerais era esse o tema: seu estupor frente à minha determinação e obstinação.
Não lembro bem depois como foram os dias seguintes, mas por fim eu fui ao show e a minha cunhada Stella, alguns anos depois, me contou rindo que ele não dormiu nada naquela noite até eu chegar em casa, que para a minha defesa, não foi muito tarde. Eu lembro que assim que abri a porta ele veio para a cozinha pegar água, com cara de sono, e me perguntou como eu tinha voltado. Aí minha consciência dói um pouco, porque eu falei a história do taxi, que não foi verdade. Mas não dava para falar a verdade naquele momento. É claro que eu fiz amigos no show, não fiquei sozinha o tempo todo, e que meus novos amigos me trouxeram para casa. Mas foi uma mentira saudável, creio eu. Ele me deu boa noite e voltou pra cama. E nunca mais falamos sobre isso.
Lembro de uma noite em que fomos a um restaurante japonês! Foi a minha primeira vez em algo que depois viria a ser minha obsessão! Era um chiquérrimo na lagoa, lembro que tinha uma grande parede de vidro e víamos a árvore de natal no meio da lagoa. Esta noite foi muito interessante para perceber a teimosia de dois taurinos jantando juntos, e sozinhos. Ele disse que se recusava a se sentar na mesa de alguém, num restaurante japonês, que não comesse de hashi (os pauzinhos). E eu, obviamente, não sabia comer de hashi e muito menos ia aprender nesta noite. E fiquei tão puta com o comentário dele, que por isso, resolvi não tentar. Assim que sentamos na mesa, conversamos, foi extremamente agradável, mas eu só comi sopinha enquanto ele se deliciava com mil e quinhentos sushis!! Adoro esta história!
Na última semana no Rio, ele queria me convencer a ficar mais. Eu voltava uma quinta, e ele repetia e repetia que não tinha sentido, que eu devia ficar para o fim de semana. Aí ele pegou o jornal e começou a ver os próximos shows que teriam na cidade. E me lembro que queria me convencer a ir a um outro, sozinha. (risos)
Eu não fui ao show nem fiquei, porque estava perdendo aulas preparatórias para o vestibular em Brasília. Mas me lembro disso sorrindo, e imaginando como era tamanha a sua vontade de me ter mais um tempo em sua casa.

4 comentários:

Linda Alice!! disse...

Ai, Ronalds...lembro da sua formatura de 2ºgrau...que a gente dançou muito com o Bruno!!! Nunca me esqueço daquela noite...ele era muito gente boa!!!

Sua historia me emocionou!

Um beijo !!!

Linda Alice!! disse...

Perdão...me referi ao Daniel !! Mas o Bruno também é uma figura!!!
hehehehe

dizquefuiporai disse...

hahhaa
Obrigada, quiuls!!
beijão

While I'm bored... disse...

que bom que tem todas essas memorias!! e obrigada por dividi-las... adorei!

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